quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Rua do Século, 79 - Frederico Lourenço



Os gradeamentos das janelas
negam a quem as contempla da rua
qualquer sugestão de vida
a ser vivida por trás das grades.
Os caixilhos em ferro forjado
sugerem locutórios de um convento
da mais ascética austeridade,
como se o espaço (cujo acesso
as grades peremptoriamente vedam)
fosse votado por inteiro a extremos
exacerbados de misticismo e de penitência.
Mas também se pressentem salões escuros,
onde paira sempre o cheiro fresco a encerado,
ou o perfume de rosas e noz moscada;
paredes revestidas de damasco,
cobertas de grandes telas,
paisagens campestres e naturezas mortas.
Medalhões de talha dourada, segurados
por fitas de seda listrada a duas cores;
silhuetas de damas coroadas de peruca,
fantasmas da corte da Rainha Louca,
imóveis nas suas molduras de tartaruga e charão.

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