quinta-feira, 28 de novembro de 2013

An Abandoned Factory, Detroit - Philip Levine

The gates are chained, the barbed-wire fencing stands,
An iron authority against the snow,
And this grey monument to common sense
Resists the weather. Fears of idle hands,
Of protest, men in league, and of the slow
Corrosion of their minds, still charge this fence.

Beyond, through broken windows one can see
Where the great presses paused between their strokes
And thus remain, in air suspended, caught
In the sure margin of eternity.
The cast-iron wheels have stopped; one counts the spokes
Which movement blurred, the struts inertia fought,

And estimates the loss of human power,
Experienced and slow, the loss of years,
The gradual decay of dignity.
Men lived within these foundries, hour by hour;
Nothing they forged outlived the rusted gears
Which might have served to grind their eulogy. 

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Bem-vindo ao anos zero - David Teles Pereira

deram-me a riqueza,
mas não me disseram o que fazer com ela

Yevgeny Yevtushenko


Com a minha idade, o meu pai já era um homem honrado,
o meu avô trabalhava na marinha mercante,
disparava ocasionalmente um ou dois foguetes
em direcção a terra seca, em homenagem ao amor de uma mulher
que conheceu antes da minha avó e que me teria dado
olhos azuis e muito menos problemas.

Aos dezoito anos os meus pais participaram na Revolução.
O meu avô também. Tinha quarenta e cinco.
Depois os meus pais casaram, desculparam-se com o ciclo da vida,
o país parecia estar no bom caminho, a casa ainda não.
Quis ser actor o meu avô, depois de ter passado
cinco dias e quatro noites a traduzir uma peça de Brecht
num quarto da pensão Rosa com vista para o rio Sado.

Então nasceu o meu irmão com os olhos que - toda a gente
confirmava - eram iguaizinhos aos da minha mãe.
Depois nasci eu e depois a minha irmã, com olhos de Varsóvia,
não tão honrados quanto belos.
Eu ainda nasci em Portugal, a minha irmã já não, nasceu na CEE,
que entretanto tinha ensinado a minha mãe e o meu pai a serem
ainda mais perfeccionistas nisso de serem honrados.
O meu avô continuava a traduzir Brecht e desconfiava
da PAC e de tudo aquilo que pudesse ser formulado
apenas em três letras.
Para ele, no mínimo, eram necessárias quatro.

Foderam-me a vida, o meu pai e a minha mãe,
e o pior é que o fizeram para que eu pudesse chegar
aos vinte e três anos e dizer que já sou um homem honrado,
tal como o meu pai tem sido, ao contrário do meu avô,
que prefere Brecht à linear organização comercial
do novíssimo amor português.

E pior ainda é que tenho vinte e três anos
e corro o risco de já ser um homem honrado.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Track - Thomas Tranströmer


Track
2 A.M. moonlight. The train has stopped
out in a field. Far off sparks of light from a town,
flickering coldly on the horizon.
As when a man goes so deep into his dream
he will never remember he was there
when he returns again to his view.
Or when a person goes so deep into a sickness
that his days all become some flickering sparks, a swarm,
feeble and cold on the horizon
The train is entirely motionless.
2 o’clock: strong moonlight, few stars.
The Winged Energy of Delight: Selected Translations. Tradução de Robert Bly, Harper Collins, 2004. 

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Um poema de Fernando Eduardo Carita


1
Todo o homem é uma invenção cuja patente
Não terá sido ainda descoberta em nenhum arquivo
Da história,
Invenção até hoje nunca reclamada por ninguém,
A solidão de um homem é esta vivência agónica de uma orfandade
Que o deixa abandonado a si mesmo,
É também a sensação obsidiante de ninguém ter ainda aparecido
Para o registar como concepção original sua,
Em constante sobressalto vive o poeta assombrado por este completo e enigmático
Desamparo que sempre o exporá aos perigos decorrentes de processos de uma falsificação
Abjecta e aleatória quando não indiscriminada,
E haverá porventura um dia em que nem ele próprio sequer saberá se é ou não
Uma mera cópia fidedigna ou uma grosseira contrafacção.

A Casa, o Caminho/La Maison, Le Chemin (edição Bílingue), 2008.

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

A Papoila e o Monge - José Tolentino Mendonça

O silêncio só raramente é vazio
diz alguma coisa
diz o que não é

*

Silêncio:
na ravina inacessível
o prado em flor


A Papoila e o Monge, Assírio & Alvim, 2013.

terça-feira, 12 de novembro de 2013

10th Chorus Mexico City Blues - Jack Kerouac

The great hanging weak teat of India
on the map
The Fingernail of Malaya
The Wall of China
The Korea Ti-Pousse Thumb
The Salamander Japan
the Okinawa Moon Spot
The Pacific
The Back of Hawaiian Mountains
coconuts
Kines, balconies, Ah Tarzan-
And D W Griffith
the great American Director
Strolling down disgruntled
Hollywood Lane
- to toot Nebraska,
Indian Village New York,
Atlantis, Rome,
Peleus and Melisander,
And

swans of Balls
Spots of foam on the ocean 


Retirado daqui.

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

How We Got Mother Back - Valério Romão

Imagem de Curtis Perry que ilustra o conto de Valério Romão
"How We Got Mother Back"

O texto, que foi publicado na Granta Portuguesa e traduzido e publicado na Granta Inglesa online, pode ser lido aqui.  Posso-vos dizer que é fabuloso.




terça-feira, 5 de novembro de 2013

Um dia chegamos e fazemos

um dia chegamos e fazemos e acontecemos
falamos em línguas muitas como quem não quer
a coisa e, depois, se nos sentirmos satisfeitos
arrumamos os nossos problemas para um canto
experimentamos as novidades do mercado
evitamos discussões e pode ser que apareça 
qualquer coisa de interessante

José Duarte, Série Biografia não oficial