segunda-feira, 25 de maio de 2015

Conor O’Callaghan - January Drought

It needn’t be tinder, this juncture of the year,   
a cigarette second guessed from car to brush.   

The woods’ parchment is given   
to cracking asunder the first puff of wind.   
Yesterday a big sycamore came across First   
and Hawthorne and is there yet.   

The papers say it has to happen,   
if just as dribs and drabs on the asbestos siding.   
But tonight is buckets of stars as hard and dry as dimes.   

A month’s supper things stacks in the sink.   
Tea brews from water stoppered in the bath   
and any thirst carried forward is quenched thinking you,   
piece by piece, an Xmas gift hidden   
and found weeks after: the ribbon, the box.   

I have reservoirs of want enough   
to freeze many nights over.
 
Conor O’Callaghan. Retirado daqui.

terça-feira, 19 de maio de 2015

[Infâmia] Beatriz Hierro-Lopez

A vadiagem de sino na mão, garrafa cortada e olhos cegos, tronco seco e polido com que bate compassivamente no chão, marcando tempos aos olhares que se desviam ou se fixam nesta marcha de miséria entre vagões no subterrâneo. De olhos fechados, cega vadia, cão vadio, latindo língua de sino, a mais fiel Portuguesa de há quantos séculos: o que deveríamos ter por hino à glória de uma nação enfileirada numa procissão de pernetas, manetas, cegos ou cancerosos, pedintes ou calados. Aos que não se enfileiram: este vagão é sala de espera, e sem que alguém saiba, carrilhão de pequeníssimos gestos, vozes cruas que, no trajecto, curvarão cabeça, corpo e dedos, baloiçando primaveras, verões inteiros entre as margens dos dentes, sem pão que haja além destas palavras de cobre dando pressa ao vagar de deus oculto em cada sinal de emergência. Trago ao peito medalha de prata, sino encabeçado por três rostos de asas pequenas; tenho a língua do ferro, e talvez por isso, talvez só por isso, saiba do cobre e da diferença multicolor entre este e a ferrugem dos ponteiros que ancoram passados à minha boca: o teu, o meu, o nosso. Sou vadia e o mesmo é dizer que nasci do fundo do mar onde naufrágios sepultam o progresso de outras vontades. Não tenho hino, glória ou fidelidade. E se tenho por língua esta língua, é dela o toque, a vibração contra a emergência de haver quem nos salve deste infame orgulho de ser português.
 
[Espartilho]. Coimbra: Debout Sur L’Oeuf, 2015. Retirado daqui e disponível aqui

segunda-feira, 11 de maio de 2015

Notes on the River 8

Voilà! Slums levelled, wharves, boat ramps,
central planning.
Whites, Koreans, Chinese
in cravats and big sombreros
sip their Caiperoskas
in the Foreign Correspondents Club,
the Nikon 1960 meets
Phnom Penh 2008.
The last His Majesty made Super Eight
for weekly banquets.

In the new arcade of palms
the slave-girl folds her fan
and turns on the air-conditioner.

Adam Aitken. Retirado daqui

terça-feira, 5 de maio de 2015

Ninguém Meu Amor

Ninguém meu amor
ninguém como nós conhece o sol
Podem utilizá-lo nos espelhos
apagar com ele
os barcos de papel dos nossos lagos
podem obrigá-lo a parar
à entrada das casas mais baixas
podem ainda fazer
com que a noite gravite
hoje do mesmo lado
Mas ninguém meu amor
ninguém como nós conhece o sol
Até que o sol degole
o horizonte em que um a um
nos deitam
vendando-nos os olhos
Sebastião Alba. "Ninguém Meu Amor" A Rosa do Mundo – 2001 poemas para o futuro. Assírio & Alvim, 2001.