segunda-feira, 27 de novembro de 2017

The Space - Aldo Nove

We all have tremendous
need to say or rather to write
that we no longer know what to say
nor what to write everywhere
and endlessly since silence
is the white space into which falls residue
the meaning in excess but so much,
too much present and everywhere.

What remains of the world
is prose that rankles expressing
its own syntax
only or not even.

It is this normal scare.

Aldo Nove. Addio mio Novecento. Einaudi, 2014.
Poema retirado da antologia Italian Contemporay Poets, editada por Franco Buffoni.

terça-feira, 21 de novembro de 2017

Joaquim Manuel Magalhães

Poucas vezes a beleza terá sido tanta
como no lustro preto dos sacos de lixo
à porta dos hotéis, dos armazéns, das casas de comida
nas mais pequenas horas da noite em Londres.
Estão amontoados fechando o esterco,
os lençóis com sangue, os restos apodrecidos,
adesivos negros que parecem afagos.
Os homens ao lançá-los nas fornalhas
são erguidos a imaginações malditas,
à feroz acção de deuses nos vulcões,
ao odor sacrílego de alquimistas mortos.
Ir na luz eléctrica e ver esses maços de treva,
essa cor quase molhada dos plásticos
a parecer verniz, a parecer chamar-nos,
a dar-nos o sebo como se fosse a arte,
tem um fervor que finda o pequeno mal, a vida.

Joaquim Manuel Magalhães. Consequência do Lugar (2001).

segunda-feira, 13 de novembro de 2017

O Avô disse ao gato - Catarina Nunes de Almeida

O poema não é uma asa-delta com um poema
não se levanta voo com um poema somos bem capazes
de nem ir a lado nenhum.


O poema é apenas uma forma delicada
de um homem se despenhar
sobre os destroços de um outro homem.


Catarina Nunes de Almeida. O Dom da Palavra. Lisboa: Não Edições, 2016.

terça-feira, 7 de novembro de 2017

"Still Life With Lost Cosmonaut" - John Burnside

If I imagine you dead, there is no love
immense enough to bring you back to earth;
but here, in this bowl of apples, on this kitchen
table, gold
and crimson in a space
that could not be more ample or precise
I see you drifting in the selfsame light
that I inhabit, wishing not
to occupy, or slip loose, or possess,
life being more to me than I could ever
wish for, colour, shape, the subtleties
of shade, and when I bite into the fruit,
the taste of it, much more than I could
wish for; though I wish you could be here.


John Burnside. Still Life With Feeding Snake. London: Jonathan Cape, 2017.

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

Teseu sem o Minotauro - Vítor Nogueira


Como em qualquer labirinto, estas esquinas
apenas garantem que não há certezas
na direcção do futuro. Lisboa
nunca foi como em tempos a sonhei.

E contudo venho aqui em peregrinação
habitual, sem tão-pouco saber que lhe pedir.
Indecisões da fé e da sua alavanca diminuta,
à qual desmesuradamente chamamos coração.


Retirado daqui.

Bagagem de mão.  Lisboa: & etc., 2007.