quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

on new year's eve - Evie Shockley

we make midnight a maquette of the year:
frostlight glinting off snow to solemnize
       the vows we offer to ourselves in near
silence: the competition shimmer wise

       of champagne and chandeliers to attract
laughter and cheers: the glow from the fireplace
       reflecting the burning intra-red pact
between beloveds: we cosset the space

       of a fey hour, anxious gods molding our
hoped-for adams with this temporal clay:
       each of us edacious for shining or
rash enough to think sacrifice will stay

       this fugacious time: while stillness suspends
vitality in balance, as passions
       struggle with passions for sway, the mind wends
towards what’s to come: a callithump of fashions,

       ersatz smiles, crowded days: a bloodless cut
that severs soul from bone: a long aching
       quiet in which we will hear nothing but
the clean crack of our promises breaking.

Retirado daqui.

domingo, 27 de dezembro de 2015

O capitão continua desaparecido


O capitão continua desaparecido,
ninguém o consegue encontrar.
O tempo foge. Ficámos parados em
terra meses a fio. Aprendi
todo o tipo de profissões: até me 
ensinaram a ler o reflexo
do sol nas águas de diferentes
oceanos, uma espécie de cinema
do mundo. Mandaram-nos procurar outros
portos fora desta terra. Vezes e
vezes sem conta resistimos. 
Nestas águas existem muitos peixes
e, por vezes, surgem alguns animais
gigantes. Ninguém conseguiu
encontrar a grande Baleia Branca, 
por isso mesmo também não
conseguimos encontrar o capitão
quando fizemos as primeiras
missões de salvação. Só encontrámos
destroços, madeira e algumas roupas.
Mais do que isso apenas e só um grande
turbilhão. Às vezes imagino a mão do 
capitão estendida acima das águas.
Continuar por aqui pode
parecer um erro, mas não há outra
alternativa. Se avistarmos a Baleia
talvez tenhamos também a nossa
hipótese de vingança. Mas continuam a 
insistir na pequena quantidade de peixe
deste oceano e dizem-nos
que em outros portos tesouros saltam
à vista. Alguns dos meus companheiros
embarcaram em grandes navios 
na esperança de encontrar essas riquezas.
Homens dos mar só sabem pescar. É o que 
melhor fazem na vida. 
O capitão continua desaparecido. Eu fico por
aqui. Só conheço a minha história,
e a história desses homens para quem 
não existe mais nada a não ser o mar.

sábado, 26 de dezembro de 2015

Comer uma Laranja - Luis Filipe Parrado

Comer uma laranja
é como ingerir o próprio sol,

com a boca cheia de luz
não há portanto 
espaço
para palavras
sobre mim.

Luis Filipe Parrado. Retirado daqui.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

White Demon Love Song - The Killers

Dentro de Casa - José Tolentino Mendonça

Todas as casas se parecem
com um naufrágio ou um saque
testam sucessivamente a elasticidade das gerações
compõem-se de heranças, jogos descasados,
cinco ou seis cores que vão ficando
sinais de um poder apenas atenuado

Quando estamos fora
à mercê dos elementos
o mundo celebra em nós
aquilo que se extingue

Estação Central. (2012). Lisboa: Assírio & Alvim.

sábado, 19 de dezembro de 2015

Tirar a Solidão - Sónia Baptista

sei fazer música com uma pedra espalmada
abraçar as árvores do lado que se adormece a norte
seios, que os tenho, contra musgo espartilhados

se do abraço o verde tinge fico um dia de molho, entre correrias de água

solta, riacho, salta
que frio não sinto

beijos de truta no peito barriga coxas são sabão

depositam-me pepitas de ouro na mão

confundiu-se uma, truta, de amores uma vez

desovou-me na mão
a direita
a roçar a margem

de novo musgo fiz ninho a jusante

larguei da mão, montei guarda

cantei embalos com pedra espalmada

nomes de baptismo, bolacha, chá verde, matcha

luva, cão, camisa branca de seda muito leve e tudo o que sinto falta, eu bicho impossível da neve

ter saudade da língua queimada de chá, cevada, chocolate quente

aqui queimar a língua com frio dormente

com musgo nos lábios à espera

e, quando um dia o tempo amainou

num instante para sul nadaram

bolacha, chá verde, matcha

luva, cão, camisa branca de seda muito leve e tudo o que sinto falta, eu bicho impossível da neve

Sónia Baptista. Tempus Fugit. Mariposa Azul: Lisboa, 2012.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Um poema de Luna Miguel - Azor Común

Ted Hughes escribió, a propósito de un azor, “yo mato donde quiero porque todo me pertenece”, sin embargo intuyo que el poeta no se refería exactamente a aquel rapaz, pues lo que mata cuando gusta, lo que destruye cuando se le antoja, lo que destroza cada cuerpo no es una simple ave antigua, sino el cáncer común. 

Lo sé: la enfermedad anida en nuestros espejos. 

Lo entiendo: y lavaré mi sexo con lejía. Frotaré mi sexo con lejía para que mis hijos nazcan sanos. 

Accipiter gentilis… los ratones tiemblan bajo el rastro de tu vuelo, 
los insectos tiemblan bajo el rastro de tu vuelo, 
los dolientes tiemblan, pero ella sonríe, 
¿has visto cómo sonríe? 

Ahora aléjate.

Luna Miguel. Los Estómagos. La Bella Varsovia Editorial, 2015.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

Lluvia Repentina - Luis Chaves

Él no pierde el tiempo en recuerdos. Ahora menos que nunca. Ahora que le incomoda hasta su modo de pestañear. Ahora que dejaron atrás la costa y empiezan el ascenso de montañas que de cerca dejan de ser azules. Ahora que las cenizas de su cigarro caen en las alfombrillas de hule cada vez que el automóvil acierta una irregularidad en el asfalto. Ahora que se cruzan las miradas en el retrovisor y que, inopinadamente, estalla una lluvia de granizos pesados, como si alguien hubiera roto el parabrisas del cielo.
Luis Chaves. Asfalto. Un Road Poem, retirado daqui.

domingo, 6 de dezembro de 2015

The Blue Book - Owen Sheers

The Blue Book

Blue Books, The (3 vols., 1847). Reports published by the Government on the state of education in Wales…the Commissioners reported that the common people were dirty, lazy, ignorant, superstitious, deceitful, promiscuous and immoral, and they blamed all this on Nonconformity and the Welsh Language.” – Encyclopedia of Welsh Literature


Lingen, Symons and Johnson,
Their names give them away,
holding thumb-cornered text books,
not a word of Welsh between them.
Page or man.

They found their God spoken in words
that ran unnaturally in their ears,
and they wrote their decree.
Rather silence than these corrupt tongues,
the words of the father shall not be passed on to the sons.
                                          
                                          *

Because this is how an empire is claimed
not just with stakes in stolen land,
but with words grown over palates,
with strength of tongue as well as strength of hand.

                                            *

And now another blue book
this, my brother’s school book
(bill – postered with bands, but blue beneath)
and inside, the Welsh in his and his teacher’s hand.

It has fallen open on a half written page,
the space beneath his work shot across with red pen:
Pam nad yw hyn wedi ei orffen?”
“Why is this not finished?”

Well, maybe it is now, if not in me, then in him,
my brother, ten years younger,
but a hundred and fifty years and one tongue apart.

The Blue Book ©  Owen Sheers , 2000

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

E a palidez das manhãs em que se parte - Miguel Cardoso

Então

é isso: de pouca vida em pouca vida
uns frascos uns relógios que brilham
e uns tubérculos secos


É isso: de pouca vida em pouca vida
uns frascos uns relógios que já não brilham
e uns tubérculos secos


e farto de saber sacudir flores estou eu.


Não sei é para que servem estes botões que piscam.


Sei outras coisas porque li eliot
e uns franceses que ele lia.
Sei que o tempo vai estar frouxo
com possibilidade de trevas.


Sei marcar o compasso porque comprei um agrafador.


O que estiver mais à mão da nua tarde.


Vi funcionários a fazê-lo e enlouquecem


como os restantes nos intervalos das horas
para expediente basta
um gramofone ao fundo
espalhar uns papéis de embrulho
como cacos de outra vida com mais fome.


Não há como


os clássicos modernos
esses armazéns de espécies
botânicas apropriadas ao turismo de ecos
e guinchos com secura de pontas
de cigarros e pobres fins de mundos e nisto
vem claro sem surpresa o verão
de novo abaixo. É dos nervos
que ficaram invernais e pouco
adianta ir para sul ir tomar o café lá fora
atiçar Oh Oh Oh


o açúcar os mortos outras especiarias granuladas
ou despirmo-nos muito milimetricamente
debaixo dos círculos de gritos das gaivotas.


Está é preciso dizê-lo devidamente inverno
para coisas destas.


E livrar-mo-nos das pálpebras
junto ao rio escuro e dizer: está na hora
sai-me mas é da frente e entretanto pinga
qualquer coisa repetidamente deve ser do tempo


e dizer sou Tirésias sai da frente
vou para ali deitar-me no divã pôr um disco
com som de chuva
enquanto espero pelos anúncios.


Não se chega de repente ao futuro
e raramente vem ao fim de semana.
Vá. Anunciem anúncios.
Desejos tenho eu.


Será uma especiaria o açúcar
pois olha como se espalha pelo chão.


Os Engenhos necessários. Lisboa: &etc