terça-feira, 30 de outubro de 2018

Nuno Marques - Dia do Não (Douda Correria, 2018)

  «uma faca um murro
no ventre 
na barriga 
nos bofes
nas bochechas 
nas orelhas 
no peito 
nas nádegas

                abrir 
                sangrar 
                entrar 

                contra o muro 
em pé à bruta 
                de costas com força 
                a roncar 
                a estremecer 

                calado 
                uma chapada 
entre os olhos
                a abrir 
                a entrar »

sexta-feira, 26 de outubro de 2018

Matilde Campilho - Conversa de fim de tarde depois de três anos no exílio

Os garçons empilhando as cadeiras
você me olhando e me pedindo que 
fale Por Favor Mas Não Escreva
eu evitando o toque ruim dos ponteiros
do relógio que anuncia a já famosa fuga
de nossos corpos cada um para sua
ponta da cidade - se nosso amor fosse
revólver eu seria o cabo e você a mira
tal como dizia a professora Sofia Jones
é terrível a existência de duas retas
paralelas porque elas nunca se cruzam 
e elas apenas se encontram no infinito 
a verdade é que nunca nos interessou 
a questão do infinito mas o resto
das ideias matemáticas claro que sim
eu na verdade prefiro mais de mil vezes
sua chávena de chá ficando fria sobre a mesa
enquanto você fala sobre raízes quadradas
enquanto você fala sobre ladrões de figos
enquanto você fala sobre o tropeço da baleia
subitamente eu já nem sei sobre o que você fala
porque a forma como seu dente incisivo corta
e suspende toda a beleza da cafetaria
faz com que eu novamente entenda que 
pelo sétimo dia é chegada a hora do cuco
e do canto do cuco
portanto eu pego minha bicicleta
e como de costume você faz meu retrato
de cabelo todo desenhado no vento
em jeito de menino que está sempre indo embora
voltará à mesma hora para o mesmo amor
a mesma mesa a mesma explosão 
com toda a certeza a mesma fuga
porque você e eu a gente é feito de matéria
escorregadia, i.e., manteiga, azeite, geléia
e espanto.

Matilde Campilho


segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Acquainted with the Night - Robert Frost

I have been one acquainted with the night.
I have walked out in rainand back in rain.
I have outwalked the furthest city light.

I have looked down the saddest city lane.
I have passed by the watchman on his beat
And dropped my eyes, unwilling to explain.

I have stood still and stopped the sound of feet
When far away an interrupted cry
Came over houses from another street,

But not to call me back or say good-bye;
And further still at an unearthly height,
One luminary clock against the sky

Proclaimed the time was neither wrong nor right. 
I have been one acquainted with the night.