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No
jornal: mulher esteve nove anos morta em casa. Passou quase uma
década entre o momento íntimo dessa morte e o maior ou menor espavento civil
(e/ou religioso) que a autorizou. A morte, que acontece sempre aos outros,
precisa, idealmente, da exibição do seu resíduo: o corpo consumado. Ou então de
um vestígio, notícia, um boato que seja. Se ninguém acolheu a morte dessa
mulher, então ela só morreu (tornou a existir) de facto, no dia em que a
encontraram no chão do seu apartamento. Mais do que uma utopia, ou um hiato
(uma hiatopia) o lugar e o tempo onde e em que ela desexistiu (apurados e
admitidos postumamente) têm a dimensão do mito. E eis que o vocábulo apartamento atingiu
ali a sua literalidade. Mas de nada, para nada, por nada e em tempo nenhum
Um Lugar a Menos, Edição de Autor, 2012.
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