segunda-feira, 6 de maio de 2013

ARTE AMERICANA DO SÉCULO XX - José Tolentino de Mendonça



Há um telefone que toca
O homem levanta-se e fala por longo tempo
condescendente a cada repetição
Podia ser um cônsul errante
podia forçar a memória a soltar
a enseada, a estação ou o trilho
mas para entregar-se à luz
é preciso ser devorado por ela
e aparentemente ele depende disto
que vai repetindo:
«não que não te deseje boa sorte
para resolveres este sarilho.»
Duas horas depois está à janela
sem conseguir dormir
Há uns miúdos em algazarra mesmo ao seu lado
e dá-lhes tempo para se afastarem
pois falharia à primeira pergunta
que alguém fizesse
O luar apanha o rebentar da onda
quando ela se aproxima
e durante esses instantes
é como se a natureza ficasse ao contrário
e o tempo com ela
Estação Central, Assírio & Alvim, 2012

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