Os factos
são o espelho as coisas mostram-
-se atravessadas pelos rios
do som. A poesia
quebra o vidro do dia como duma
cratera a voz do fogo lança
os jactos
Gastão Cruz, in O Pianista, 1984
“Books are finite, sexual encounters are finite, but the desire to read and to fuck is infinite; it surpasses our own deaths, our fears, our hopes for peace.” ― Roberto Bolaño
quinta-feira, 28 de junho de 2012
quarta-feira, 27 de junho de 2012
terça-feira, 26 de junho de 2012
A Radically Condensed History of Postindustrial Life - David Foster Wallace
When they were introduced, he made a witticism, hoping to be liked. She laughed extremely hard, hoping to be liked. Then each drove home alone, staring straight ahead, with the very same twist to their faces.
The man who'd introduced them didn't much like either of them, though he acted as if he did, anxious as he was to preserve good relations at all times. One never knew, after all, now did one now did one now did one.
David Foster Wallace, Brief Interviews with Hideous Men, Abacus, 2001
segunda-feira, 25 de junho de 2012
White Nights - Paul Auster
No one here,
and the body says: whatever is said
is not to be said. But no one
is a body as well, and what the body says
is heard by no one
but you.
and the body says: whatever is said
is not to be said. But no one
is a body as well, and what the body says
is heard by no one
but you.
Snowfall and night. The repetition
of a murder
among the trees. The pen
moves across the earth: it no longer knows
what will happen, and the hand that holds it
has disappeared.
of a murder
among the trees. The pen
moves across the earth: it no longer knows
what will happen, and the hand that holds it
has disappeared.
Nevertheless, it writes.
It writes: in the beginning,
among the trees, a body came walking
from the night. It writes:
the body’s whiteness
is the color of earth. It is earth,
and the earth writes: everything
is the color of silence.
It writes: in the beginning,
among the trees, a body came walking
from the night. It writes:
the body’s whiteness
is the color of earth. It is earth,
and the earth writes: everything
is the color of silence.
I am no longer here. I have never said
what you say
I have said. And yet, the body is a place
where nothing dies. And each night,
from the silence of the trees, you know
that my voice
comes walking toward you.
what you say
I have said. And yet, the body is a place
where nothing dies. And each night,
from the silence of the trees, you know
that my voice
comes walking toward you.
Paul Auster, Disappearances: Selected Poems (1988)
domingo, 24 de junho de 2012
sexta-feira, 22 de junho de 2012
Elogio da Solidão - José Alberto Oliveira
Uma casa para estrear e descobrir
em quantas salas se acomoda a solidão.
Cozinhou o jantar e come atentamente
como todos quantos dividem a comida em silêncio:
o náufrago, o mendigo, o oleiro na lancheira.
Coze o seu barro, um jeito de partir o pão
que deve ao tempo uma lentidão coalhada.
O ruído do vizinho não o incomoda.
Nenhuma fala ou resíduo humano leveda
uma página ao acaso. Pode decidir beber mais vinho
ou inaugurar a leitura de outro livro.
Mesmo sair para beber café e mastigar o frio.
No pasto, a chuva rega a placidez do boi;
abana a cabeça, fumegam as narinas,
desenha-se num fundo de pinhal que o vento
castiga; na caruma molhada pressente-se
o rumor de um cão absorto na ilusão
do que procura. Coisas mínimas, irrisórias,
vão salvar o resto da noite de presumir felicidade.
Lá fora a cidade está cercada na convicção
das suas vidas perdoáveis, mercando
um alimento longamente dispensável
- a respiração em vitualhas e sarcasmos,
a pobreza irresignável e irresolúvel,
o cansaço de não estar só e não querer estar.
José Alberto Oliveira
por alguns dias
Assírio & Alvim, 1992
Retirado daqui
em quantas salas se acomoda a solidão.
Cozinhou o jantar e come atentamente
como todos quantos dividem a comida em silêncio:
o náufrago, o mendigo, o oleiro na lancheira.
Coze o seu barro, um jeito de partir o pão
que deve ao tempo uma lentidão coalhada.
O ruído do vizinho não o incomoda.
Nenhuma fala ou resíduo humano leveda
uma página ao acaso. Pode decidir beber mais vinho
ou inaugurar a leitura de outro livro.
Mesmo sair para beber café e mastigar o frio.
No pasto, a chuva rega a placidez do boi;
abana a cabeça, fumegam as narinas,
desenha-se num fundo de pinhal que o vento
castiga; na caruma molhada pressente-se
o rumor de um cão absorto na ilusão
do que procura. Coisas mínimas, irrisórias,
vão salvar o resto da noite de presumir felicidade.
Lá fora a cidade está cercada na convicção
das suas vidas perdoáveis, mercando
um alimento longamente dispensável
- a respiração em vitualhas e sarcasmos,
a pobreza irresignável e irresolúvel,
o cansaço de não estar só e não querer estar.
José Alberto Oliveira
por alguns dias
Assírio & Alvim, 1992
Retirado daqui
quinta-feira, 21 de junho de 2012
quarta-feira, 20 de junho de 2012
terça-feira, 19 de junho de 2012
Charles Simic - Errata
Errata
Where it says snow
read teeth-marks of a virgin
Where it says knife read
you passed through my bones
like a police-whistle
Where it says table read horse
Where it says horse read my migrant's bundle
Apples are to remain apples
Each time a hat appears
think of Isaac Newton
reading the Old Testament
Remove all periods
They are scars made by words
I couldn't bring myself to say
Put a finger over each sunrise
it will blind you otherwise
That damn ant is still stirring
Will there be time left to list
all errors to replace
all hands guns owls plates
all cigars ponds woods and reach
that beer-bottle my greatest mistake
the word I allowed to be written
when I should have shouted
her name
Charles Simic
Retirado daqui
Where it says snow
read teeth-marks of a virgin
Where it says knife read
you passed through my bones
like a police-whistle
Where it says table read horse
Where it says horse read my migrant's bundle
Apples are to remain apples
Each time a hat appears
think of Isaac Newton
reading the Old Testament
Remove all periods
They are scars made by words
I couldn't bring myself to say
Put a finger over each sunrise
it will blind you otherwise
That damn ant is still stirring
Will there be time left to list
all errors to replace
all hands guns owls plates
all cigars ponds woods and reach
that beer-bottle my greatest mistake
the word I allowed to be written
when I should have shouted
her name
Charles Simic
Retirado daqui
segunda-feira, 18 de junho de 2012
Shirley Ann Eales - Rui Pires Cabral
Na vitrina lê-se Livros Raros
e Usados sob o azul inclinado
de um toldo – mesmo em frente
à glacial cafetaria de franchise
onde o dia destrata o desejo
e não se pode fumar. Subo
aos pequenos gabinetes
mergulhados no doce bafio
da literatura e percorro de A
a Z as espinhas estreitas
e rachadas da poesia. É o sítio
mais vazio de Novembro
e o que mais me reconforta;
o livro que escolho, por metade
de uma libra, traz no frontispício
um nome e uma morada: Shirley Ann
Eales, de Scottsville – um sumido
autógrafo de maiúsculas magras
e triangulares onde a imaginação
encontra por enquanto pretexto
e oxigénio suficientes para arder.
O livro teve outra existência,
pertenceu a outra casa, a outra mesa
de cabeceira – e o pensamento,
de tão óbvio, conjura de repente
uma vertigem, é um corredor
abrupto para a imensidão do mundo
onde trafica o acaso. Ah, sabemos
que a vida é improvável se damos
por nós a cismar, a meio de uma tarde
insípida, numa mulher desconhecida
que lia poemas em Scottsville, nos anos
70. Mas haverá aqui alguma espécie
de sentido, algum sinal guardado
para alguém mais sábio ou inocente
do que eu? Não sei quem és
nem onde estás agora, Shirley Ann,
mas como seria belo se pudesses
um dia encontrar, por obra da mesma
sorte, o teu nome nestes versos.
Retirado daqui
e Usados sob o azul inclinado
de um toldo – mesmo em frente
à glacial cafetaria de franchise
onde o dia destrata o desejo
e não se pode fumar. Subo
aos pequenos gabinetes
mergulhados no doce bafio
da literatura e percorro de A
a Z as espinhas estreitas
e rachadas da poesia. É o sítio
mais vazio de Novembro
e o que mais me reconforta;
o livro que escolho, por metade
de uma libra, traz no frontispício
um nome e uma morada: Shirley Ann
Eales, de Scottsville – um sumido
autógrafo de maiúsculas magras
e triangulares onde a imaginação
encontra por enquanto pretexto
e oxigénio suficientes para arder.
O livro teve outra existência,
pertenceu a outra casa, a outra mesa
de cabeceira – e o pensamento,
de tão óbvio, conjura de repente
uma vertigem, é um corredor
abrupto para a imensidão do mundo
onde trafica o acaso. Ah, sabemos
que a vida é improvável se damos
por nós a cismar, a meio de uma tarde
insípida, numa mulher desconhecida
que lia poemas em Scottsville, nos anos
70. Mas haverá aqui alguma espécie
de sentido, algum sinal guardado
para alguém mais sábio ou inocente
do que eu? Não sei quem és
nem onde estás agora, Shirley Ann,
mas como seria belo se pudesses
um dia encontrar, por obra da mesma
sorte, o teu nome nestes versos.
Retirado daqui
sexta-feira, 15 de junho de 2012
quinta-feira, 14 de junho de 2012
quarta-feira, 13 de junho de 2012
Céline - David Teles Pereira
para a Julie
A vida tem destes acasos literários:
um comboio, dois livros e a pior
das razões para nos apaixonarmos.
Tenho vinte e dois anos e o equivalente
em retratos teus -periféricos ou não-
catalogados de acordo com as horas psicologicamente
intermináveis do teu sorriso.
O nosso amor é como o lado vazio de uma ampulheta,
ou seja , inverso ao próprio tempo que não marca
o surgir inesperado daquelas noites em que tudo acontece
numa peça de teatro à qual nunca comparecemos.
As tuas mãos são um jardim demasiado inconstante
para fazer fila e esperar a morte. Tens seis letras no nome
e antes que amanheça saberei em que lugar do meu corpo
cada uma delas cabe.
A vida tem destes acasos literários:
um comboio, dois livros e a pior
das razões para nos apaixonarmos.
Tenho vinte e dois anos e o equivalente
em retratos teus -periféricos ou não-
catalogados de acordo com as horas psicologicamente
intermináveis do teu sorriso.
O nosso amor é como o lado vazio de uma ampulheta,
ou seja , inverso ao próprio tempo que não marca
o surgir inesperado daquelas noites em que tudo acontece
numa peça de teatro à qual nunca comparecemos.
As tuas mãos são um jardim demasiado inconstante
para fazer fila e esperar a morte. Tens seis letras no nome
e antes que amanheça saberei em que lugar do meu corpo
cada uma delas cabe.
David Teles Pereira
in Revista Criatura N.º 2 , 2008
in Revista Criatura N.º 2 , 2008
terça-feira, 12 de junho de 2012
segunda-feira, 11 de junho de 2012
FOR BREATHING AND AIRPLANES
Would you believe
it that on air
planes people who
are next to you
will push on the
button if you’re reading in
the dark? Your chances are two in
two based on recent studies. They believe
it has something to do with the
population getting nicer and the air
being thinner up there. You
would be surprised at who
isn’t turning on reading lights for who
ever is reading in
the dark these days. You
met the Spaniards, no? I believe
they are the two most beautiful—she’s the heir
to L’Oréal—people in the
world I’ve ever seen. The
thing is her breath smells but who
wouldn’t mind kissing a face like that—the air
from your mouth would help hers in
the meeting of the two. I believe
we have to make sacrifices for beauty if you
know what I mean. Once you
had a friend, I think I remember, and the
sister of the friend believed
in people with small feet who
would come into her room in
the night and lift her and leave her mid air.
They were not pretty but the air
they breathed would turn you
pretty if you too had small feet and in
the morning your mother would open the
door and see you and wonder who
had made you different. My mother believes
in thinking about the air that
holds you and whoever—she
believes in holding things.
Amanda Nadelber - retirado daqui
sexta-feira, 8 de junho de 2012
quarta-feira, 6 de junho de 2012
Previsão do tempo
Não será, com certeza, perversão
minha olhar-te as pernas num
dia lindo de sol. Tenho a certeza
de que não te importas. Se fosse de
outra maneira não sorrias.
Sei bem que esboças um sorriso
de cada vez que isso acontece.
Amanhã dizem que chove,
pelo menos a calcular pela previsão
do tempo, as nuvens cinzentas
espalhadas por todo o lado,
o vento agressivo, os pingos
de água a atravessarem o chão
que, durante muito tempo, esteve
quente. Só tenho pena que
não tragas uma saia
para que eu aprecie a tua cor
de praia, as pernas longas e fabulosas.
De qualquer das formas, em caso de
tempestade, podemos sempre usar o meu
quarto. Tenho a certeza de que continuarás
a sorrir, mesmo chovendo.
Da série Biografia não Oficial
(A sair um dia destes)
José Duarte
minha olhar-te as pernas num
dia lindo de sol. Tenho a certeza
de que não te importas. Se fosse de
outra maneira não sorrias.
Sei bem que esboças um sorriso
de cada vez que isso acontece.
Amanhã dizem que chove,
pelo menos a calcular pela previsão
do tempo, as nuvens cinzentas
espalhadas por todo o lado,
o vento agressivo, os pingos
de água a atravessarem o chão
que, durante muito tempo, esteve
quente. Só tenho pena que
não tragas uma saia
para que eu aprecie a tua cor
de praia, as pernas longas e fabulosas.
De qualquer das formas, em caso de
tempestade, podemos sempre usar o meu
quarto. Tenho a certeza de que continuarás
a sorrir, mesmo chovendo.
Da série Biografia não Oficial
(A sair um dia destes)
José Duarte
terça-feira, 5 de junho de 2012
segunda-feira, 4 de junho de 2012
Hope - Emily Dickinson
Hope is the thing with feathers
That perches in the soul,
And sings the tune--without the words,
And never stops at all,
That perches in the soul,
And sings the tune--without the words,
And never stops at all,
And sweetest in the gale is heard;
And sore must be the storm
That could abash the little bird
That kept so many warm.
And sore must be the storm
That could abash the little bird
That kept so many warm.
I've heard it in the chillest land,
And on the strangest sea;
Yet, never, in extremity,
It asked a crumb of me.
And on the strangest sea;
Yet, never, in extremity,
It asked a crumb of me.
Roubado daqui.
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