sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Um poema de Diogo Vaz Pinto


«O esperar de certos seres
      e de certas horas
que a sua juventude lhe seja devolvida»
  Julien Gracq, A costa das Sistes 

"Tive o tempo que quis e mais algum
para me tornar sério. Não fui por aí.
A família tinha a sua conta, e eu
sempre me fodi com números. Nunca
me deu para fechar linhas, ser firme,
ou manter a formação. Gosto de variar
a continência. Olhei muito em volta,
tudo piscava um olho. Não sei
governar-me, não sei com quantos
paus (...) nem sei fazer-me à vida,
antes faço que não é comigo. Mas sei
o que é amanhecer. Tenho colecções 
sem importância nenhuma, frágeis,
simples. O tinir da primeira luz
nos galhos, logo a gritaria dos pássaros
cavando a alvorada em roucas rajadas.
Uma aragem presa absorvendo
o aroma sumarento e entontecedor
de uns frutos caídos. A moleza e essa
sombra que me caiu às costas escorregando
de outro mundo"

in Bastardo, Averno, 2012

Sem comentários:

Enviar um comentário