terça-feira, 31 de dezembro de 2019

E pronto, é isto - o último post

Em 2020 não há mais blogue. Obrigado por tudo a todos. 

Slow Karma - David Fonseca

Feliz Ano Novo (e a lista de 2019)

Música (sem ordem aparente):

1. Remind Me Tomorrow (Sharon Van Etten)

2. Soliloquy (Lou Dillom)
3. Father of the Bride (Vampire Weekend)
4. All Mirrors (Angel Olsen)
5. Closer to Grey (The Chromatics)
6. Everyday Life (Coldplay)
7. Giant of All Sizes (Elbow)
8. Wave (Patrick Watson)
9. The Center Won't Hold (Sleater-Kinney)
10. This Land (Gary Clark Jr.)

Menção honrosa para I Love You. It's a Fever Dream (The Tallest Man on Earth).


Livros (entre poesia, não ficção e ficção)


1. The End (Karl Ove Knausgaard)

2. Poetry: a Survivor's Guide (Mark Yakich)
3. Animalescos (Gonçalo M. Tavares)
4. Um Tropeço nos Dias Quentes (João Bosco da Silva) 
5. The M Train (Patti Smith)
6. Movimento Perpétuo (Ana Cristina Pereira)
7. Trás-os-Montes, o Nordeste (J. Rentes de Carvalho)
8. Sebastião (Rosalina Marshall)
9. Senhor Roubado (Raquel Nobre Guerra)
10. Ventos Borrascosos (Fernando Guerreiro)

Filmes


1. Plus One (Jeff Chan, Andrew Rinner)

2. Frankie (Ira Sachs)
3. The Great Hack (Karim Aner, Jehane Noujaim)
4. Parasites (Bong Joon-ho)
5. The Beach Bum (Harmony Korine)
6. The Last Man in San Francisco (Joe Talbot)
7. Once Upon a Time on Hollywood (Quentin Tarantino)
8. Bacurau (Kléber Mendonça Filho e Juliano Dornelles)
9. Avengers: Endgame (Russo Brothers)
10. High Life (Claire Dennis)
11. Joker (Todd Philips)
12. Sorry to Bother You (Boots Riley)
13. Diamantino (Gabriel Abrante, Daniel Schmidt)
14. Marriage Story (Noah Baumbach)
15. The Irishman (M. Scorsese)
16. Birds of Passage (Ciro Guerra)
17. Ash is Purest White (Jia Zhang Ke)
18. Long Day's Journey into Night (Bi Gan)
19. Under the Silver Lake (David Robert Mitchell)
20. Sandy Wexler (Steve Brill

domingo, 29 de dezembro de 2019

Alexandre Sarrazola - Madrid

à beira da estrada para Meknès, por detrás do mato, escondida assistias
(demasiado perto da sua Toyota Hilux) ao buliçoso trabalho das três prostitutas;
na sombra fresca do quarto, de manhã ou depois da sesta, as quatro trocavam
djellabas coloridas e babouches bordadas com lantejoulas, para a Primavera


esta noite descemos, à luz de um petromax, os degraus que levam,
entre águas, gatos e urina, à estrada do Hotel Madrid e um homem
(que se enamorou de teus cabelos de prata) avisa-te de mão estendida
dos «borrachos della calle de arriba», «voleurs» que não são dignos
de que pises em seu quelho de lixo e memórias obliteradas
pelo vidro quebrado das garrafas proibidas


a floresta de faróis volta a enovelar-se de palavras
e da poeira do tempo - o homem desaparece na escuridão da mesma rua
deitamo-nos na açoteia  e falas de Batuta, Polo, Loti e Wilde, o morrão incandescente
na tua mala a cassete com as suras; as palavras (insististe) ditas por um ancient
para ouvirmos amanhã no leitor do carro; a lua ocre liquesce e não adormecemos


de volta da nossa bagagem as crianças e o riso das mulheres sob a árvore do jasmim
«bonne route», sempre um anjo da guarda e gatos a fugir sobre os telhados do hotel
depois do terceiro sebsi, o homem levanta-se da soleira e debruça-se na tua janela
óculos de massa, caspa nas sobrancelhas, fato branco e uma camisa de polyester
com suspensórios escoceses; os sapos sujos de lama e meias de garridas cores;
exnota com as unhas encardidas um mendigo e aperta-te a mão do lado do sol


os olhos e a voz: não te focavam e escondiam-se na luz que entretanto já apaguei;
tu bem sabes: «é que me arrancaram pela nuca a língua que usava para escrever
aqueles outros poemas»

domingo, 22 de dezembro de 2019

Raquel Nobre Guerra - Um poema de Senhor Roubado

«Quem nunca hesitou na paragem do 28
e pensou: ali vai a metáfora da minha vida.
E nem por pensá-lo escapou ao açude
de mandar parar tanta gente só por si.
Não é possível ser feliz com tanta correspondência
e entre nós que vamos em itinerários românticos
cruz na porta da tabacaria é tão-só o aviso
para lavar a cabeça contra o pessimismo.
Se não te aconchega o lumaréu de estar vivo
não te aflijas quando predizem a meteorologia
uma estação no inferno será sempre o destino.»

sábado, 14 de dezembro de 2019

Rua Doménikos Theotokopoulos - João Miguel Fernandes Jorge

Ao fim do dia

quando o róseo edifício dos banhos

fica magoado de som

e o paredão do mar se confunde

com as sirenes que se derramam ao longe

restam as ruas estreitas dedicadas aos

pintores de ícones

perto de Kunkapi, o bairro mais pobre –

a sinagoga, paredes meias, nunca foram

ricos os judeus da cidade


a cintar todas as casas, ao modo de

um fosso, a Rua de Minos abre singela

passagem para o Bairro das Luzes

Vermelhas

Alexia, Anna e também Maria

aguardam nas suas casinhas de prazer

fantasias de qualquer realista –

na parede, a negro – fuck the polis